O Rei do Rock and Roll


A música sempre esteve presente na vida de Bruce Springsteen. Desde quando ainda era um bebê e brincava no piano na sala de estar da Tia Dora até o rádio que sua mãe Adele mantinha na cozinha em cima da geladeira, onde o garoto cresceu ouvindo música pop, doo-wop e Roy Orbison.

Para mim, o rádio nos anos cinquenta foram milagrosos. Era como TNT saindo dos alto-falantes. Entrava, te agarrava pelo coração e te levantava. Aquelas músicas diziam que a vida valia a pena ser vivida. O rádio foi até onde nenhuma outra coisa havia conseguido chegar.

 Mal sabia-se que a vida do garoto de sete anos de idade estava prestes a mudar no dia 6 de janeiro de 1957, pois naquele domingo a noite Elvis Presley estaria no The Ed Sullivan Show, um programa de variedades na rede CBS.

Elvis ensaiando para a apresentação daquele dia
"Foi um sinal precoce de que você poderia ser simplesmente diferente. E que a diferença que você já pode estar sentindo não era necessáriamente uma desvantagem, não era necessariamente inapropriada, errada ou inadequada. De repente havia um sinal único, singular."

O setlist teve grandes sucessos como: Hound Dog, Love Me Tender, Heartbreak Hotel e Don't Be Cruel. E o que se pode dizer, é que aquela noite foi essencial e teve um grande impacto na vida do menino.

"Ele tinha essa atitude, atrevida, incontestável. Parecia como uma criança que é atraída para uma brincadeira. Parecia ser tão divertido. Imagine essa autoconfiança sendo atirada sobre você subitamente. O que aconteceria se você despejasse tudo aquilo durante dois minutos e meio, como um músico! Foi uma chave enorme que destrancou nossas imaginações, corações e espíritos".

Quando viu Elvis, Bruce decidiu que precisava de um violão. Então lá foram ele e a mãe até a loja de instrumentos Mike Diehl's Music para realizar seu sonho, e então o alugaram por seis dólares por semana. Após uma ou duas aulas e perceber que sua mão ainda era muito pequena, o menino viu que aquilo não seria um processo tão simples: aprender teoria musical, escalas e acordes era um processo muito longo para um garoto de sete anos de idade. E assim rapidamente o interesse dele diminuiu e o violão voltou para a vitrine da loja de música.



Mesmo assim, ele ainda estava sedento por Elvis, então juntou 69 centavos que e comprou um EP com quatro sucessos do Rei, porém na voz de um cara chamado Dusty Rhodes. Não era o original, mas aquilo era suficientemente parecido para fazer a alegria do menino.

Apesar da frustração em sua primeira experiência musical, Elvis havia plantado uma semente na cabeça do menino, que anos mais tarde voltaria a comprar um violão (com dinheiro que ganhou por pintar a casa de sua Tia Dora) e ganharia a tão sonhada guitarra Kent de Natal em 1964. Esses ingredientes, misturados com a explosão dos Beatles e a fascinação dos garotos da época pelas bandas de rock, trilhariam o caminho de Springsteen até o seu primeiro contrato com uma gravadora.

E é exatamente daí que as coisas continuam. Em 1972, Bruce foi ao seu primeiro show do Elvis. Não se sabe a data exata, mas foi em um dos quatro shows que ocorreram no Madison Square Garden entre 9 e 11 de junho, na mesma semana em que assinou seu primeiro contrato com a Columbia Records.


Em 1975, o chefe estampou a capa do seu poderoso álbum "Born to Run" com um bottom do rei do rock na correia da guitarra. O acessório era de um fã clube do cantor chamado "King's Court". O grupo foi formado em 1972 por fãs que se conheceram enquanto esperavam na fila da venda de ingressos para aqueles quatro shows no Madison Square Garden, em que o Bruce esteve presente. Cerca de oito meses após o clube ser formado, produziram quinhentos bottoms para serem distribuídos entre todos os integrantes. O líder do fã clube conta: "O único jeito que o Bruce poderia ter conseguido um desses bottoms era sendo membro ou conhecendo alguém que fosse. Não distribuíamos para mais ninguém."

Mas a história mais conhecida até hoje ocorreu quatro anos depois, na madrugada do dia 30 de abril de 1976. Na euforia de estar na cidade de seu ídolo, Bruce pulou o muro da casa de Elvis. Ele próprio contou a história em diversos shows durante a carreira, como contou em Paris no dia 29 de maio de 1985, pela turnê Born In The U.S.A.


No dia 28 de maio de 1977, Bruce foi prestigiar Elvis na Philadelphia e inclusive levou o companheiro Stevie Van Zandt junto, mas aquele definitivamente não foi um de seus melhores shows. Então, imaginando uma música especialmente para a voz de seu cantor favorito, Bruce escreveu "Fire" e enviou a demo para seu endereço, mas ela só chegou dias depois da morte de seu ídolo, em 16 de agosto daquele ano. Resolveu ir para o estúdio gravá-la, e como ainda não havia lançado um grande hit até então, viu nela grande potencial. Porém, sentindo que a canção nada tinha a ver com a ideia do álbum em que estava gravando (Darkness On The Edge of Town), deixou-a de lado. Tempos depois ele entregou a música para Robert Gordon e para o grupo Point Sisters, que alcançou o primeiro lugar das paradas de vários países com a canção. Ouvindo a versão do criador dá pra ter noção de que se encaixaria perfeitamente na voz de Presley.


Alguns anos depois, durante as sessões de gravação de Nebraska, Bruce gravou "Johnny Bye Bye", canção sobre a morte de Elvis. A letra foi remodelada várias vezes, mas o mais interessante é que o primeiro e o último verso permaneceram intactos. A versão mais famosa foi gravada durante as sessões do álbum Born In The U.S.A., no início de 1983. Começa com as linhas de "Bye Bye Johnny", do Chuck Berry, que captura o romantismo e a promessa do estrelato no rock and roll seguido pela imagem de um funeral. E acaba com um olhar duro sobre o triste fato: "They found him slumped up against the drain / With a whole lot of trouble running through his veins / Bye-bye Johnny, Johnny bye-bye / You didn't have to die / You didn't have to die". O fato é que a morte do ídolo, da maneira que ocorreu, deu a ele uma nova percepção do outro lado da fama. 

"Eu era criança e vi Elvis no Ed Sullivan Show e me lembro perfeitamente que olhei para ele e disse: Eu quero ser... desse jeito! Mas eu cresci e não pretendia mais ser daquele jeito. Por que ele era o maior sonhador. Era como um grande libertador. Me lembro de um amigo me ligar e me contar que ele tinha falecido, o quê não me espantou pois não fazia muito tempo que eu tinha visto ele na Philadelphia. Pensei muito sobre isso. Como alguém que poderia ter tido tanto poderia no fim acabar daquela maneira e como os sonhos não significam nada ao menos que você seja forte o suficiente para lutar por eles e torná-los reais. Você tem que agarrar a si mesmo."

Observando sua discografia e encontrando diversas referências ou até mesmo a forma como Bruce se comporta em cima do palco, podemos afirmar que Elvis teve um grande impacto na carreira musical de seu admirador. Ele representava mais do que tudo, uma nova linguagem, maneira de pensar e de ouvir música.



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